quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

NO CALOR DA DOR, A EMOÇÃO DO AMOR

Janeiro de 1979, uma viagem inesperada interrompeu os negócios de Paulo. Até então, vivia em sua pacata cidade, sem muita ambição e problemas sérios. O avião no aeroporto estava de partida numa das poltronas, Paulo Novaz porte athetico, lia a carta de sua noiva Fernanda. Aquele dia amanhecera nublado e com fortes ventos. Seus olhos percorriam as páginas daquele papel como se buscasse algo além das palavras, enquanto isso o avião movimentava-se na pista, alcançando os céus rapidamente. As palavras daquele pequeno bilhete expressavam saudades e dizia: “Estou ansiosa esperando noticias suas. Aqui nada de novo, e a rotina às vezes me deixa desanimada, a não ser a alegria que compartilhei com Glória, César e Lima de terem passado no vestibular, foi muito legal. Querido os dias sem você são duros, e não vejo a hora deste curso chegar ao fim para novamente está em seus braços. Você é uma pessoa maravilhosa que amo muito, e não imagina como essa distância me faz mal, mas logo, logo o curso terminará e seremos muitos felizes para nos amarmos”. Beijos – Nanda.
Entretanto aquelas palavras pareciam tão artificiais, sempre que recebia carta dela, era simples, curtas demais e até mesmo fúteis. Estava decidido de lhe fazer uma surpresa, mas estava preparado para qualquer tipo de problema que pudesse vir a acontecer, aquele era o motivo de sua viagem.
A aeromoça ofereceu-lhe um drink, o qual aceitou naturalmente. Da pequena janela do avião observava as nuvens e a imensidão do céu. Podia ver a tempestade que caía torrencialmente, e vez por outra balançava o avião, causando um certo medo nas pessoas.

Paulo Novaz tinha 32 anos, homem bem sucedido na vida, herdara do pai uma pequena rede de supermercados em sua cidade, que era uma pessoa que todos amavam, sempre procurava ajudar os mais necessitados, após sua morte por causa de problemas cardíacos, a cidade não foi mais a mesma, e assim alguns dos problemas da cidade acabavam tendo que ser resolvidos por Paulo, que pacientemente continuava o trabalho do pai. Na época que seu pai falecera, era apenas um jovem de 20 anos, ainda imaturo, desconhecia totalmente o teor dos negócios do pai, assim teve de inicio certa dificuldade, mas logo facilmente conseguiu direcionar adequadamente os negócios. Conhecera Fernanda numa dessas festinhas na casa de um dos seus amigos, assim que a viu sentiu irresistivelmente atraído, com sua maneira dócil de falar e de ser. Seus cabelos caídos aos ombros, negros, olhos esverdeados, parecendo uma deusa grega.
A forte tempestade sacudia o avião com maior intensidade, e algumas pessoas, principalmente umas senhoras com o terço na mão rezavam. Ouviam-se trovoadas assustadoras.
Naquele momento uma moça japonesa o encarava insinuadamente, fazendo com que esboçasse um sorriso, sendo consequentemente correspondido.                                                                                              
A torrente de chuva lá fora aumentava e o panico era geral. Paulo fechou os olhos tentando dormir, idealizando sua chegada em Belo Horizonte. Do seu lado a aeromoça ajudava a velhinha a amarrar seu cinto de segurança. Segundos mais tarde o avião entra em pane, caindo entre as matas do estado de Goiás, algumas explosões, gritos de morte, a chuva torrencial ajudou a conter o fogo, e um silêncio se fez.
Ao despertar do estado de inconsciência Paulo Novaz, ouve um canto de pássaros e atordoado abre os olhos. Meio sonolento percebe o que aconteceu bem ao seu lado a moça japonesa estava imóvel, mas ainda respirava. Levantou-se lentamente, sentindo o chão fugir de seus pés, a cabeça girar, caindo novamente.O relacionamento de Iara com Paulo, despertara nele um sentimento estranho. Era uma jornalista recém-formada, trabalhava para um jornal em Minas. Conversavam muito, principalmente quando iam juntos pegar água, ela havia lhe dito que tinha um namorado que a amava, mas que ela apenas sentia uma ternura e admiração profunda.  Com o convivo dia após dia, ela sabia que algo forte estava sentido por Paulo, aquele rapaz gentil, que pacientemente cuidava de todos, às vezes se pegava pensando nele, e sentia um enorme medo que algo lhe acontecesse quando saía em caçada com o comandante.
Na cidade o noticiário informa em rede nacional o desaparecimento do vôo 205 da VARIG, e começam as buscas do Boeing. Na casa de Paulo Novaz, seus familiares ficam apreensivos, sua mãe inconsolável, ainda tinha esperança que seu filho estivesse vivo. A irmã de Paulo, Débora, liga imediatamente para Fernanda, avisando do que havia acontecido com o noivo.
Novamente Paulo desperta do transe em que se encontrava, e o cheiro forte de carne queimada exalava no ar. Levanta-se e ainda encontra força para ir até o local em que se encontrava a moça japonesa, ainda estava respirando, de súbito fica feliz. Faz um esforço enorme para carregar aquele corpo um tanto frágil, colocando perto de uma árvore.  Vê um corpo de um homem aparentando 50 anos, ainda respirava, retira alguns destroços do avião que estavam sobre ele, e este abre os olhos, com certa dificuldade e com o auxilio de Paulo caminha até a árvore onde se encontrava a moça japonesa. Alguns passageiros tinham sobrevivido àquele terrível acidente, eram apenas 15 sobreviventes, o restante, esses estavam irreconhecíveis, carbonizados. Agora o que fazer estavam sem nenhuma comunicação, nenhum radio funcionava, sem água e sem comida. Diante da situação Paulo percebeu alguns animais e pássaros, logo imaginou que deveria ter água por perto. Comunicou aos outros passageiros, que iria procurar água, pois era o único que estava em boas condições físicas, seus ferimentos eram leves. Ouviu então a voz do comandante que dizia ter forças para acompanhá-lo. Paulo, mas este explicou  o quanto ele era necessário para os outros sobreviventes que permanecesse esperando por ele, depois dele era o mais saudável.
Percorreu uma área enorme, e não conseguia uma gota d’água, ia desisti, quando um animal chamou sua atenção. Parecia um castor, ou um desses roedores  que vivem se enterrados na terra. Como que por impulso de sobrevivência, tentou segurar o bichinho, imaginava que poderia dar uma boa refeição. Entretanto, mais rápido e esperto o bichinho começou a correr, e Paulo atrás, desesperado. Seu instinto de sobrevivência lhe impulsionava a segurar aquele pequeno roedor, com a mão enfiada em sua toca, conseguiu capturar o bichinho. Logo adiante viu um pequeno córrego o qual  sentiu uma imensa felicidade. Imediatamente, encheu a vasilha para levar ao local do acidente, agora sabia que poderiam sobreviver.

Os dias foram passando paulatinamente, e não aparecia o socorro, enquanto isso Paulo e comandante, já restabelecido, caçavam os pequenos animais, faziam fogueiras, se revezavam à noite por causas dos animais, eram 07 sobreviventes.Haviam enterrados todos os corpos, construído algumas malocas com os destroços. O que mais fazia feliz Paulo, era o canto dos pássaros e a presença de Iara, a japonezinha que lhe sorrira a 05 dias atrás quando o avião caiu naquelas colinas. Alguns passageiros ainda precisavam de socorro adequado, uns estavam mutilados e ainda agonizavam de dor. Com um carinho especial Paulo cuidava daquelas pessoas, procurando confortá-las.
                       
Nas cidades por todo Brasil surgiam os mais variados boatos sobre o avião desaparecido, nesses 07 dias de buscas não davam em nada, alguns jornais noticiavam as mais absurdas versões, um desses sensasionalistas dizia que o avião havia sido engolido por um enorme disco voador, outros diziam que haviam sido raptados por terroristas libaneses, e outros ainda anunciavam que com a queda do avião nenhum sobrevivente havia. Os jornais competentes publicavam que tanto o exercito e aeronáutica estavam em buscas constantes, mas que nenhum dado concreto da localização do avião e seus passageiros.
Paulo continuava sua rotina dia após dia, e mais uma morte aconteceu no acampamento, agora eram apenas 06, que brigavam heroicamente minuto a minuto pela vida. Apesar de todas as dificuldades vivenciadas, para Paulo aqueles dias lhe davam uma enorme sensação de alegria, e ele sabia que era por causa de Iara, já não pensava na noiva, e se esta estava sendo infiel ou não, agora não mais interessava. Naquela madrugada, o sono demorava a chegar, dormia perto de Iara, seus corpos juntos, tão próximos, que sem querer sentiram que estavam abraçados, como numa mágica e sensual energia, e o inevitável aconteceu, ambos sentiram a maior felicidade.
Aquele dia amanhecera chovendo. Paulo sorriu para o dia e o canto dos pássaros lhe trazia uma sensação de paz e quietude enorme, respirou fundo e agradeceu mais uma vez a Deus por estar vivo e feliz. Repentinamente, ouviu uma zoada que parecia de um helicóptero, correu para chamar o comandante, e aos gritos procuravam chamar atenção, como por instinto pôs mais madeira na fogueira, queimando até sua roupa, era a única esperança que tinha desde o dia que o avião caíra. O piloto do helicóptero se comunica com a base, havia descoberto os destroços, e finalmente acabara aquela busca, depois de l3 dias.
O socorro não demorou, logo que chegaram os reforços. Os seis sobreviventes, uns ainda gravemente machucados, respiravam aliviados, finalmente poderiam ir para casa, Deus tivera misericórdia com todos, estavam vivos e livre daquele sofrimento.
Paulo e Iara prometeram novamente se encontrar, mesmo porque ambos teriam que resolver suas vidas, para livremente amarem-se. Sabiam que agora finalmente suas vidas iriam ter um novo começo, no amor sincero e construido dia após dia pelo sofrimento, apesar de tudo estavam felizes.
              

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